sexta-feira, 28 de julho de 2023

O que é legalismo?

“Legalismo é elevar regras humanas acima das instruções e princípios dados por Deus em sua Palavra; é julgar o próximo de pecar (acusando-o no coração ou verbalmente) quando tais regras não são seguidas” (Lou Priolo).

Não é errado enfatizar obediência a Palavra de Deus (ver Jo 14:15; 15:10-11; 1Jo 2:3-6).  Também não é errado estabelecer regras feitas por homens para serem cumpridas em determinas instituições, ao contrário, muitas vezes regras humanas são necessárias para que organizações ou instituições tais como a família, a igreja e o estado funcionem de maneira eficaz. Errado é colocar tais regras acima ou no mesmo nível dos mandamentos de Deus.

Quando julgamos alguém por não seguir nossas regras, estamos julgando a Deus de ter sido negligente em não colocar na Bíblia o que achamos que deveria estar lá. Jesus disse que aqueles que ensinam preceitos de homens como sendo doutrina, são hipócritas pois participam de vã adoração (Mt 15:7-9; Mc 7:6-7).

Veja abaixo algumas características comuns de uma pessoa com raciocínio legalista:

  • Costuma julgar pessoas que possuem opiniões diferentes dele como estando erradas, sendo imaturas e não espirituais.
  • Cria polêmicas em relação a diferenças doutrinárias com outros cristãos.
  • Tem dificuldades em manter comunhão com cristãos que discordam de sua posição doutrinária.
  • Costuma avaliar o próximo mais para o lado do erro e do juízo, e quase nunca para o lado da misericórdia.
  • Crê que todo comportamento é certo ou errado, preto ou branco; não deixa espaço para áreas cinzentas.
  • Pensa em Deus mais como um Juiz do que como um Pai Celestial amoroso (ver estudo sobre Escrupulosidade: clique aqui).
  • Julga outros como não sendo bons pais por permitirem que seus filhos façam coisas que ele não permitiria, mesmo que não sejam pecados prescritos na Bíblia.
  • Julga outros cristãos pelo seu estilo de vida, por exemplo: mulheres não devem usar calças. Namorar é errado, cortejar é bíblico. Ouvir música “do mundo” é errado. Fazer tatuagem é errado. Tomar bebidas alcoólicas é errado etc.

Muitos cristãos professam corretamente que a salvação é pela graça, exclusivamente por meio da fé em Cristo, mas seu modo de viver trai essa declaração, pois sua fé em Cristo é acrescida de obras humanas. Mesmo tendo uma boa teologia bíblica, ter estudado credos e confissões de fé e concordar com todos eles, sua teologia prática muitas vezes é oposta ao que ele crê e ensina para as pessoas, pois ele adota padrões legalistas que governam o vestir, o comer, o beber e assim por diante. O pior disso tudo é que ele julga o próximo por não seguir seu estilo de vida legalista.

O legalista normalmente eleva o padrão para o próximo, já o perfeccionista eleva para si mesmo. Ao julgar o próximo ele se coloca como um Legislador, ou seja, ele está se colocando no lugar de Deus (Tg 4:11-12). Quando ele julga o próximo, ele julga a lei, ou seja, ao julgar seu irmão por não ter feito algo errado (algo que a Bíblia não condena) ele está automaticamente julgando a Bíblia por não ter as restrições que ele impõe aos outros.

O legalismo se concentra em regras externas ao invés de pensamentos, atitudes ou motivações interiores (Mt 23). O legalista é um fariseu cheio de justiça própria que julga o próximo impiedosamente, fazendo críticas constantes. Uma das coisas mais tristes do legalismo é que ele oferece uma aparência de maturidade espiritual quando, na verdade, faz o cristão regredir em sua experiência com Deus (ver Gl 4). Suas motivações podem até ser boas, porém seus métodos são errados.

O legalista carrega um fardo muito pesado por tentar obedecer a Deus como forma de obter mais favor ou aceitação de Deus. Ele não consegue desfrutar de uma consciência de justiça sabendo que seus pecados do passado, presente e futuro foram cobertos pelo sangue de Cristo.

Segundo Lou Priolo, podemos categorizar o legalismo em dois subtipos:


  • Legalismo doutrinário: demonstra uma atitude arrogante para com aqueles que não cortam o “t” e nem pingam o “i” de maneira tão precisa como ele julga que deveriam fazer em questões teológicas.
  • Legalismo aplicado: cobra dele mesmo e dos outros um comportamento não exigido pelas Escrituras.

O legalismo torna a vida infeliz. Ele tira a alegria e a liberdade. Vemos em Gálatas 4:15 o apóstolo Paulo perguntando: “O que aconteceu com aquela alegria que vocês experimentaram quando ouviram o evangelho e creram em Cristo?” Os judaizantes haviam aparecido e roubado o coração dos convertidos com seu legalismo.

“O legalista tende a ser cego para o seu próprio legalismo” (Ed Welch). Jesus chama o fariseu de cego e hipócrita várias vezes (Mt 23:16-26). Ele concentra sua atenção às pequenas coisas a ponto de negligenciar as coisas importantes. O legalista se encontra cego para sua própria arrogância. Como perdeu a visão da sua própria pecaminosidade, ele coa mosquito, mas acaba engolindo camelos (Mt 23:24). Ele se sente como um cristão especial acima dos outros.

O legalista tem dificuldade em se mostrar gracioso para com o próximo. Ele é alguém intolerante. O legalista defende com unhas e dentes um ponto obscuro da teologia e depois julgará, censurará, desrespeitará e maldirá aqueles que possuem um pensamento diferente dele. Ele costuma diminuir as pessoas que não se encontram em seu “nível teológico”.

O legalista é capaz de causar divisões desnecessárias entre cristãos. O legalismo é contagioso, ou seja, ele contamina o próximo com sua hipocrisia. Paulo condenou a atitude de Pedro por ter se afastado dos gentios, exatamente por causa da marca externa da circuncisão. Ele chamou esse ato de hipocrisia (dissimular em Gl 2:13). Pedro fingiu que suas ações eram motivadas pela fidelidade, quando na verdade eram resultantes de seu medo, pois o termo “dissimular” nesta passagem significa hipocrisia. Para piorar sua hipocrisia resultante de seu medo (temor de homem), também levou outros a se desviarem com ele, como foi com Barnabé.

 

“A censura é a origem da impiedade e da separação pecaminosa na vida do censor; quando se convence de que seus irmãos são piores do que ele, então reprova seus irmãos, abandona a comunhão e os evita porque são más companhias para ele” (Richard Baxter).

 

O medo de fracassar é algo que alimenta o legalismo. O legalista se preocupa demais com sua reputação diante dos homens. Por causa da sua obsessão perfeccionista ele teme fracassar em áreas nas quais não é pecado fracassar. Ele “teme o pecado onde não há nenhum” (ele possui uma consciência escrupulosa:clique aqui para saber mais). Frequentemente ele tem preocupações e medos excessivos em cometer um pecado, distinguir o certo do errado, como tomar decisões e ter certeza da salvação. A ansiedade que resulta dessas preocupações pode levar a confissão excessiva de pecados.

O legalista é conhecido como um “estraga prazer” por causa do seu espírito impaciente, irritável, exigente e crítico. Ele não considera que a “misericórdia triunfa sobre o juízo” (Tg 2:13). Ele teimosamente se apega à sua visão, recusando-se a reconhecer que existem outros cristãos que enxergam as coisas de maneira diferente e como resultado faz com que as pessoas se distanciem dele.

O legalista tem um desejo excessivo de agradar os outros. Ele está disposto a fracassar em seu ministério na família, para poder dedicar mais tempo e esforço em seu trabalho ou ministério na igreja. Ele não se importa em fracassar como cristão, cônjuge, pai, membro da igreja ou amigo desde que possa obter os melhores resultados em seu trabalho ou ministério eclesiástico.

Muitos pais estão provocando seus filhos a ira ao discipliná-los de forma legalista, ou seja, elevando regras feitas pelos homens ao mesmo nível dos mandamentos de Deus estabelecidos nas Escrituras. Os pais devem apresentar de forma clara o que é Lei de Deus e o que é Lei da Casa para seus filhos.

A Lei de Deus são leis orientadas pela Bíblia, que todos os homens estão obrigados a fazer porque Deus ordenou. Alguns exemplos seriam: ame ao Senhor teu Deus de todo coração e ame o teu próximo como a ti mesmo; não minta, não roube, não cobice e etc. Por outro lado, a Lei da Casa são regras derivadas da Bíblia, e devemos obedecê-las enquanto estivermos sob as autoridades estabelecidas por Deus em nossas vidas, neste caso os pais são autoridade na vida dos filhos, e alguns exemplos seriam: ir para cama às 20:30hs, arrumar a cama todas as manhãs, assistir somente uma hora de TV por dia, não namorar até completar determinada idade etc. 

Quando estas regras não ficam claras, os filhos podem rejeitar o verdadeiro cristianismo. Esse tipo de legalismo pode provocar ira nos filhos. Por exemplo, jamais diga a seu filho que: “É da vontade de Deus que você corte o cabelo”. Esta é uma regra da casa, e não um mandamento do Senhor. O mesmo exemplo se dá ao caso de tatuagem, corte de cabelo, brinco, música, bebidas e comidas. Explique para seus filhos que estas são regras da casa, sabendo que elas podem ser recorríveis, ou seja, apeláveis, porém, as regras de Deus, nunca podem ser recorridas.

O legalismo é pecado, pois está enraizado no orgulho. É pecado porque faz com que julguemos sem misericórdia o nosso irmão em Cristo que não segue os padrões elevados e extrabíblicos que a nossa consciência escrupulosa pressupõe que deveria ter sido incluída à Palavra de Deus. É pecado porque é contrário à graça. É pecado porque provocou a ira em Jesus Cristo contra os líderes religiosos hipócritas dos seus dias.

Chamar o que Deus denominou de bom como mal é muito sério (Is 5:20). Aquilo que Deus criou para seu povo desfrutar com ações de graças é um dom de Deus e não deve ser censurado (1Tm 4:1-5; 6:17; Ec 5:18-19; Rm 14:6; 1Co 10:30-31). Quando o legalista inculca proibições humanas na consciência de outros cristãos que estão acima e além daquilo que a Bíblia ensina, ele coloca uma pedra de tropeço no caminho deles. Estes novos mandamentos se tornam um fardo para os outros, exatamente o contrário do jugo de Cristo, que é suave (Mt 23:4). Estas regras humanas não têm valor algum! Não tem poder nenhum contra o pecado (Cl 2:20-23).

Abandone o legalismo e procure unir-se a Cristo pela fé desfrutando de sua maravilhosa graça (Ef 2:8-9; Jo 3:3; Rm 6:23; 1Co 15:3; 1Pe 3:18). Nossa união com Cristo nos faz entender nossa adoção. Pessoas legalistas tendem a enfatizar certos aspectos do caráter de Deus. Por exemplo, eles acentuam sua justiça e santidade, mas não sua misericórdia e graciosidade. Sua visão funcional de Deus é que ele é distante, severo, punitivo, impiedoso e impaciente. (Quem não viveria com medo de um Deus assim?) Sua visão de Deus é equivalente a um pai terreno que é duro e crítico, constantemente mostrando seu descontentamento. “Adoção procede não do mérito da lei, mas da graça da fé” (João Calvino). Viver no legalismo é o mesmo que defraudar o direito de adoção. O legalista tem dificuldade de enxergar Deus como Pai celestial amoroso e misericordioso, pois ele se concentra muito em regras e pouco na graça e na misericórdia.

Aprenda a discernir o que realmente é pecado e o que não é (Is 5:20; 29:13). Não force e não julgue outros cristãos a seguirem regras extrabíblicas que funcionaram para você (Rm 14:4). Por exemplo, se eu decido não acessar a internet quando estou sozinho para não ser tentado acessar sites de conteúdo imoral, esta é uma regra que talvez funcione para mim, porém, não quer dizer que todo mundo precisa seguir o mesmo protocolo para lidar com a tentação. Cuidado para não exercer um controle desordenado (extrabíblico) sobre aqueles que estão sob os seus cuidados, pois isso é um abuso de autoridade.

Ao invés de proibir seu filho de ir a um cinema, de ir a uma festa ou fazer uma tatuagem, pergunte: “Qual é a sua motivação de fazer isso?”. O legalista condenará todas as atividades como pecaminosas sem qualquer preocupação com a motivação da pessoa por fazer ou participar da atividade (Jo 7:24; 1Sm 16:7). Lembre-se, o modo como você trata as pessoas será o modo como você será tratado (Mt 7:1-5).

Tenha prazer em obedecer aos mandamentos do Senhor como expressão de amor, gratidão, lealdade e devoção a Deus, caso contrário, você obedecerá para tentar melhorar sua condição perante Deus ou para merecer seu amor, e isto é legalismo.

 

REFERENCIAL TEÓRICO

PRIOLO, Lou. Legalismo: considerações e aplicações. São Paulo: Nutra Publicações, 2021.

_______. Filhos Irados: Uma abordagem Bíblica. 2. ed. São Paulo: NUTRA, 2018.

Seu filho tem dificuldades em prestar atenção?

Prestar atenção é uma habilidade difícil para todas as crianças. Dar nossa atenção corretamente é uma luta normal. Embora seja uma luta co...