sábado, 6 de abril de 2019

O evangelho é a base para o ministério pastoral


Infelizmente não são poucos o que se candidatam para ministério pastoral baseados em uma ambição egoísta, ao contrário da aspiração santa (1 Tm 3:1), e como consequência, muitos compreendem o chamado para o ministério pastoral como uma oportunidade de crescimento profissional, como de uma carreira que pressupõe certo grau de habilidades em negócios, interesse próprio, recompensa pessoal e reconhecimento público. John Piper diz que “a profissionalização do ministério é uma ameaça constante à ofensa do evangelho” (PIPER, 2002, apud HARVEY, 2013, p.64).

A igreja não é uma trajetória de carreira (HARVEY, 2013, p.64). Uma das formas para compreender melhor nosso chamado é entender a distinção entre alvos e desejos com base na distinção entre perfeição e fidelidade (GOMES, 2012, p.24). Por exemplo, podemos ter como alvo o dinheiro, porém, nem sempre será possível ter dinheiro e se o tivermos, sabemos que “a traça e a ferrugem corroem, ladrões escavam e roubam” (Mt 6:19). Ter dinheiro poderá ser um bom desejo, se o seu propósito for o de servir ao alvo de Deus, de sermos honestos, fiéis e generosos. Podemos ter como alvo o casamento, que é uma instituição de Deus, porém, o casamento não é um bom alvo porque sua realização não depende de nós, depende da vocação de Deus, e, também, da vontade do outro, e caso você ouça um não, esse alvo será frustrado. Casamento poderá ser um bom desejo, se o seu propósito for o de servir ao alvo de Deus, conforme as disposições da Palavra de Deus e se houver concordância do outro. Podemos ter como alvo ser perfeitos, conforme está escrito em Filipenses 3:12-16, porém, ser perfeito não é um bom alvo porque ninguém jamais conseguirá ser perfeito neste lado da vida. Somente Deus que é perfeito, pode ter o alvo de que também sejamos perfeitos, e Ele o irá realizar (Fl 1:6). Ser perfeito para nós é algo impossível, mas é um bom desejo. Paulo diz que não havia ainda obtido ou recebido a perfeição, mas prosseguiria para esse alvo, deixando de lado os impedimentos e desejando ser fiel à sua vocação. Por vezes cometemos deslizes, mas seremos fiéis cada vez que retornarmos para Deus confessando nossos pecados buscando como alvo sermos fiéis à perfeição de Cristo. Se formos fiéis ao alvo de Deus, ele satisfará os desejos do nosso coração (Sl 37:3-4).

Aqueles que são chamados a pregar o evangelho podem ser os mais suscetíveis a afastarem-se do evangelho (HARVEY, 2013, p.41). É o evangelho que defini nossa identidade e não nossa credencial, pois quando pastores buscam proeminência o ministério está em perigo (WELLS, 1992 apud HARVEY, 2013, p.65). Por mais erudito seja um pastor (estudo acadêmico da Bíblia é essencial), sua credencial jamais deve ser a base para validação de seu chamado. “Não há chamada para o ministério que não seja primeiramente uma chamada para Cristo” (CLOWNEY, 1964 apud HARVEY, 2013, p.42). É somente porque a nossa chamada primária é garantida por meio do evangelho, mediante a cruz, que podemos nos regozijar em explorar a chamada para o ministério. Quando Paulo estava a caminho de Damasco como um profissional que tinha como objetivo matar cristãos, Cristo apareceu com notícias de uma mudança de carreira (At 9:15). Apesar de seu chamado ser singular, o que o definiu fundamentalmente não foi aquilo que ele foi chamado a realizar, nem sua educação e posição social, nem sua carreira ou seu contexto cultural. Conhecer a Cristo como Senhor superou tudo: “Sim, deveras considero tudo como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor” (Fl 3:8). “Ser escolhido para o ministério é algo sublime. Ser escolhido para a filiação á ainda mais sublime” (HARVEY, 2013, p. 43).


Sem o evangelho não temos um trabalho (1 Co 2:2). Precisamos reconhecer o verdadeiro valor do evangelho, ainda que tenhamos descoberto seu poder para nos salvar, não temos ideia do que possuímos. Paul Tripp faz uma analogia interessante sobre nossa nova identidade em Cristo e a maneira como nos contentamos em viver na pobreza. Imagine que certa tarde você receba um telefonema de um funcionário do banco que lhe informa que herdou cem milhões de reais de um parente distante. Daí você desliga o telefone todo empolgado para contar a sua esposa da fortuna recém encontrada. Corre até o banco, apresenta os documentos exigidos e saca dez mil reais para levar a sua esposa para jantar em um dos melhores restaurantes do país. Seis semanas mais tarde, sua esposa, ao analisar as despesas da casa, confusa diz: “Fulano, pensei que você tivesse dito que estávamos mais ricos do que poderíamos imaginar. Contudo, ainda vivemos como se fôssemos muito pobres. Por que ainda não vivemos da herança que você recebeu?” O marido responde: “Você sabe como é difícil ir até o banco e sacar o dinheiro? Primeiro, o banco fica no centro da cidade. O trânsito é horrível e estacionar é pior ainda. Quando você chega ao banco, precisa ficar numa daquelas filas quilométricas e, quando finalmente chega ao caixa, eles o tratam como se fôssemos criminosos e não como clientes” (TRIPP, 2009, p.350). (OBS: Isso não  tem nada a ver com a teologia da prosperidade, e sim o nosso caráter em Cristo).

O evangelho é o que realmente importa, se o removermos o ministério bíblico autêntico irá desaparecer. Homens são chamados como plantadores de igrejas, como pastores, para celebrarem a dignidade de Jesus, para garantir que nunca seja dito de sua congregação em relação ao evangelho: “Eles não têm ideia do que possuem”.

Conforme disse Dave Harvey:

Irmão, se você ama a ideia do ministério pastoral porque pensa que é qualificado para ajudar as pessoas em seus problemas, ou porque pode meditar em teologia, ou porque gosta da ideia de pessoas vindo toda semana para ouvir as coisas novas que você tem a dizer, então, preste um serviço à igreja por abandonar o pastorado (HARVEY, 2013, p.50).

Nenhum homem tem o direito de moldar a igreja de Deus para satisfazer suas próprias necessidades, pois ela foi comprada pelo sangue de Cristo (At 20:28).



REFERENCIAL TEÓRICO:

HARVEY, Dave. Eu Sou Chamado? A vocação para o ministério pastoral. São José dos Campos: Fiel, 2013.

TRIPP, Paul David. Instrumentos nas Mãos do Redentor: Pessoas que Precisam Ser Transformadas Ajudando Pessoas que Precisam de Transformação. São Paulo: NUTRA, 2009.

GOMES, Wadislau. Quem cuida de quem cuida? São Paulo: Cultura Cristã, 2012.

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