quinta-feira, 8 de setembro de 2022

Pregação sem aplicação prática não tem vida!

 Segundo Stuart Olyott, um pregador precisa ter 1) exatidão exegética, 2) conteúdo doutrinário, 3) estrutura clara no seu sermão, 4) ilustrações vívidas, 5) aplicação penetrante, 6) pregação eficiente e 7) autoridade sobrenatural (ação do Espírito Santo) para se tornar excelente! Neste artigo, focarei apenas na característica da aplicação penetrante.

Para os puritanos o propósito da pregação, era julgado não pelo que acontecia na igreja, mas pelo efeito do sermão fora dela. Pregadores puritanos preparavam seus sermões cuidadosamente. Seus sermões eram expositivos, com ensinamentos de uma passagem específica da Bíblia, e uma das características mais atraentes da pregação puritana era sua ênfase na aplicação prática da doutrina à vida.

O objetivo da aplicação era conduzir o indivíduo cristão a uma mudança de comportamento onde fosse necessária pelo despertamento da consciência. A aplicação era a vida da pregação. Para eles, se os santos não fossem edificados pelo sermão, então a Palavra não havia sido pregada. O sermão puritano era dividido em duas partes: doutrina e prática, ou seja, o sermão era tanto profundo teologicamente quanto intensamente prático. Cada sermão deveria conter doutrinas explicadas com aplicação imediata na vida das pessoas. As formas de aplicação eram divididas em sete categorias de ouvintes:

1.       Incrédulos que são tanto ignorantes quanto ineptos...

2.       Alguns são educáveis, embora ignorantes...

3.       Alguns têm conhecimento, mas ainda não estão humildes...

4.       Alguns estão humildes...

5.       Alguns creem...

6.       Alguns decaíram...

7.       Há um povo misturado...

Eles eram unânimes em dizer que a tarefa principal de um pastor era pregar. Eram homens verdadeiramente convertidos, conhecedores de idiomas, cultos, zelosos, santos, e aptos para o ministério. Eles respeitavam mais a vida de um pregador santo do que sua erudição. Um pregador tinha que ser capaz de falar com autoridade moral. Um pastor é acima de tudo alguém que alimenta e cuida de um rebanho.

A universidade de Harvard nos Estados Unidos foi fundada por pastores puritanos que se preocupavam com o ministério inculto às igrejas. O poder penetrante da pregação residia não na manipulação da audiência pelo pregador, mas na ação do Espírito Santo. As famílias faziam anotações do sermão para depois falarem sobre ele reunidos em suas casas. Mesmo sendo homens doutos, eles preparavam sermões simples pois visavam atingir toda a sociedade. O propósito do sermão não era excelência estética, mas edificação espiritual. O conteúdo de um sermão era mais importante do que sua forma. A finalidade de um sermão era servir como um meio de graça.

“A Palavra de Deus é o centro da vida da igreja”, disse Mike McKinley. Sem a Palavra de Deus, uma igreja não tem qualquer esperança, enquanto se prepara para se encontrar com este Deus que julgará vivos e mortos. Quando você prega a Palavra de Deus com fidelidade, poucas pessoas são tentadas a pensar que você é grande. Deus não está interessado na glória de pregadores (1Co 1:18-21). A Palavra de Deus é o meio que ele usará para edificar sua igreja. Se você é um pastor ou um plantador de igrejas, dedique seu tempo e energia para pregar e ensinar a Palavra de Deus com excelência!

Conheça as pessoas com quem precisa lidar, como suas necessidades. Uma igreja que possui um púlpito distante das pessoas (mensagens difíceis sem aplicação na vida das pessoas) não se torna uma comunidade, mas um palco com uma plateia para seus pregadores. Os pastores precisam não somente focar no conteúdo pretendido, mas no efeito real percebido. Isso não é pragmatismo, pois se você é um pai, você sabe muito bem que precisa utilizar uma linguagem mais fácil para ensinar seus filhos, e confiar no poder do Espírito Santo para convencê-los. Conta-se que Lutero sempre pregava na igreja imaginando estar ensinando uma criança ou adolescente de 12 anos para que todos fossem capaz de entender seu sermão.

Um pastor, um diretor, um governante, um pai, precisam conhecer seus receptores para que sua comunicação não seja um desastre. Tenha interesse em saber os dados sobre sexo, idade, nível de escolaridade, profissão, estilo de vida, passatempo pretendido, opinião sobre questões sociais, culturais, políticas etc. Na esfera da igreja por exemplo, o trabalho de exegese e hermenêutica são importantes e de real vitalidade na saúde da igreja, porém, também tem sido um esconderijo para muitos pastores fugirem das pessoas e de suas perguntas, escondendo-se atrás de sua erudição, esquecendo-se que seu ministério é público (pregação) e pessoal (aconselhamento).

Para romper a barreira do alheamento, o pregador precisa despertar a atenção, e estimular o interesse dos ouvintes, pois ele encontrará vários tipos de pessoas e obstáculos para vencer. Os três principais obstáculos são: 1) apatia: o ouvinte não está interessado nas coisas que serão ditas; 2) antipatia: o ouvinte está contra nós e contra o conteúdo que falaremos; 3) incredulidade: o ouvinte não crê no Livro que pregaremos. Como podemos chamar a atenção do ouvinte? Dando algo para que possam ficar atentos. Como fazer isso? Vejamos alguns exemplos:

1. Em um aconselhamento: Certa vez, Lou Priolo foi a um jantar de uma universidade e ele se sentou ao lado de um meteorologista. Por duas horas ele ficou perguntando sobre a previsão do tempo. Quando a noite acabou, o meteorologista apertou sua mão e disse que não se lembrava da última vez em que havia conversado com alguém tão interessante. Qual o segredo disso? Ele disse que gastou 5% da conversa falando sobre ele, e 95% conversando sobre o tempo. A melhor maneira para se fazer amigos e influenciar pessoas é exatamente isso, falar sobre assuntos de interesse delas. Considere Fp 2:4: “Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros”. Mesmo que a motivação deste versículo não seja o de ganhar amigos ou influenciá-los, pois o propósito dele é glorificar a Deus e ministrar aos outros, as pessoas podem ser atraídas para sua comunicação conversando sobre assuntos que lhe interessam quando você investe tempo e esforço para isso. Este ato, demonstra um amor sacrificial, semelhante ao de Cristo. 

“Entrar no mundo de uma pessoa capacita-nos a aplicar as verdades do evangelho de maneira específica para a pessoa e para a situação” (Paul Tripp). Durante os trinta e três anos que Jesus viveu entre nós, ele não somente foi aprovado no teste que Adão foi reprovado, mas ele também coletou dados a respeito de tudo que sofremos ao suportarmos a vida à espera de sua volta (Hb 4:15). Jesus entende a dor da traição, rejeição, dor física e solidão, ele nos conhece.

2. Em uma palestra: John Haggai conta em seu livro “Seja um Líder de Verdade” que 1975 ele tinha que fazer uma palestra muito importante nos EUA, para o qual ele orou vários dias para poder pensar em uma maneira de romper a barreira do alheamento (desinteresse das pessoas) do seu auditório. Naquela época eles estavam vivendo uma crise financeira provocada pela elevação dos preços do petróleo. Ele começou sua palestra com estas palavras: “Vou dar a vocês dez mandamentos para sobreviver em meio à crise financeira”. Ele disse que em questão de segundos podia-se ouvir uma casca de cebola caindo no tapete, de tão silencioso ficou o auditório de 2.500 pessoas. Este exemplo nos ajuda a entender que podemos romper o alheamento das pessoas ao nosso redor conversando assuntos que são do interesse deles.

3. Em um sermão: a introdução não deve ser muito longa, e nem deve prometer mais do que o sermão pode dar. Deve conter um único pensamento para poder despertar e preparar as pessoas para quilo que vem depois. Uma introdução longa, é semelhante aquele que convida amigos para um jantar, mas gasta muito tempo arrumando a mesa, a ponto de os convidados chegarem a duvidar se irão ou não jantar alguma coisa.

Muitos pregadores pensam que o sermão eficiente é somente aquele que deixa a congregação se sentindo culpada, ou seja, eles não possuem uma mensagem bíblica equilibrada sobre culpa e pecado com a mensagem bíblica de perdão e renovação. Alguns enxergam a doutrina da “depravação total” em letras garrafais e a novidade de vida em Cristo com letras minúsculas.

O desequilíbrio mais comum é a ênfase demasiada na queda. Deve haver um equilíbrio entre os elementos CRIAÇÃO/QUEDA/REDENÇÃO. A Bíblia não começa na queda, e sim na criação. Em uma cultura secularizada, onde as pessoas desconhecem conceitos básicos de teologia, é mais prudente começar pela criação e não pela queda, caso contrário seria adequado começar com a queda.

O apóstolo Paulo tinha uma abordagem baseada nas Escrituras de acordo com o seu público. Em Atos 13:14-16 ele vai pregar o evangelho em uma sinagoga num sábado. Neste texto, o grupo era formado por judeus. Também havia presença gentílica ali. Paulo inicia com um dos principais fatos da história judaica, o êxodo. Ele relembra a história de Israel até Davi, e intencionalmente, lhes introduz a promessa do Messias (At 13:23). Neste contexto ele prega a Cristo a partir do Deus de Israel, se fundamentando no Antigo Testamento para lhes apresentar o Messias. Já em Atos 17:16-31, Paulo proclama Cristo para os gentios que não conheciam as Escrituras. Ele está em Atenas, o centro filosófico do mundo da época. O sermão de Paulo neste contexto não se iniciou nas Escrituras do Antigo Testamento, ele pregou Deus a partir das evidências da criação e do deus desconhecido (At 17:23).

Em Atenas, somente depois que Paulo formou seu argumento baseado na criação (quem é Deus; quem somos; e o que lhe devemos) é que ele apresentou os conceitos de pecado e arrependimento. Ao falarmos com as pessoas do século XXI que não tem conhecimento da Bíblia, é preciso seguir o modelo de Paulo, baseando argumentos na criação antes de apresentar a mensagem de pecado e salvação.

Para isso é preciso aprender a se relacionar, pois vivemos em uma sociedade moderna cada vez mais privatizada, as “vizinhanças” desaparecem e as pessoas se fecham cada vez mais em seus mundos particulares. As pessoas não estão abertas a ouvir um estranho. O evangelismo por meio de rádio, TV, jornais, folhetos, transmissões de cultos pela internet, podem ser importantes, porém, em uma cultura privatizada, podem criar pessoas resistentes ao compromisso e ao discipulado.

Em uma sociedade cada vez mais privatizada, as pessoas raramente ouvem o evangelho a partir de estranhos. Uma igreja que é caracterizada pelo evangelismo por amizade, é desenvolvida primariamente pelos relacionamentos, e secundariamente pela determinação de programações.

Quando começamos igrejas planejadas intencionalmente para apelar a certo tipo de pessoa, falhamos em atender ao mandado bíblico de ser tudo para com todos (1Co 9:22). Muitas igrejas preferem adotar somente a primeira expressão sem a segunda. Querem ser tudo somente para um determinado grupo de pessoas e aqui está o problema. Se o público alvo da igreja são os jovens, significa que pessoas mais velhas serão alienadas. Se passamos tempo com pessoas que são da mesma idade, que gostam do mesmo tipo de música e que compartilham de nosso gosto, opinião política e preferências, em que somos diferentes do mundo (Mt 5:47)?

Quando Cristo envia um homem a pregar, Ele não comissiona apenas para expor a verdade, mas também para dizer aos seus ouvintes como praticá-la. Existem vários tipos de pessoas a nossa frente, e o que faremos com todas elas? Assim como um farmacêutico responsável entrega o medicamento com a prescrição certa para cada tipo de pessoa, e o alfaiate que entrega a roupa sob medida de modo a adequar aos vários tipos de clientes, o sermão não pode ser de “molde padrão”, pois fazendo assim o pregador não atingirá a consciência das pessoas (estudantes, pais, filhos, solteiros, casados, viúvas, desempregados, solitários, enfermos, atribulados etc.). O pregador não cumpre seu dever, se apenas diz às pessoas o que fazer, ele tem de mostrar-lhes como e porque tal coisa é digna de ser feita.

Sabemos que o resultado pertence a Deus, e que aquele que convence e transforma o coração é o Espírito Santo, porém, Deus pode transformar corações a despeito do pregador, pois sendo um Deus misericordioso, Ele ainda opera com sua Palavra que não pode voltar vazia. Esteja sempre de joelhos orando a Deus antes de pregar, pedindo que ele traga o não convertido a Cristo e faça o convertido crescer na graça e no conhecimento do Senhor.

OBS: Este artigo é apenas um guia, não é uma regra (mandamento) a ser obedecida, você pode rejeitá-lo, como também pode utilizá-lo de maneira parcial ou completa se assim quiser, Deus o abençoe!

 

REFERENCIAL TEÓRICO

HAGGAI, John Edmund. Seja um Líder de verdade: Liderança que permanece para um mundo em transformação. Belo Horizonte: Betânia, 1990.

MACARTHUR, John; MACK, Wayne. Introdução ao aconselhamento bíblico: Um guia básico de princípios e práticas de aconselhamento. São Paulo: Hagnos, 2004, p. 41-63.

MCKINLEY, Mike. Plantar Igrejas é para os fracos: Como Deus usa pessoas confusas para plantar igrejas comuns que fazem coisas extraordinárias. São José dos Campos: Fiel, 2013.

OLYOTT, Stuart. Pregação pura e simples. São José dos Campos: Fiel, 2018.

PRIOLO, Lou. Maridos Perseguindo a Excelência: Princípios bíblicos para maridos que almejam o ideal de Deus. São Paulo: NUTRA, 2011.

RYKEN, Leland. Santos no Mundo: Os Puritanos como realmente eram. 2. ed. São José dos Campos: Fiel, 2013.

TRIPP, Paul D. Instrumentos nas Mãos do Redentor: Pessoas que Precisam Ser Transformadas Ajudando Pessoas que Precisam de Transformação. São Paulo: NUTRA, 2009.

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